Do ponto de vista neurobiológico, a tristeza é uma resposta normal do cérebro a experiências negativas, especialmente se estas experiências são inesperadas, e se não há saída, ou seja, independentemente da estratégia utilizada, o sofrimento se mostra inescapável. Já o medo é uma resposta a experiências (reais ou imaginadas) de caráter ameaçador, ou seja, que colocam em risco a posição no grupo, a saúde, ou a vida do indivíduo. Por que será que a tristeza e o medo são os sentimentos do homem do nosso século? Sim, a depressão, que se caracteriza principalmente pela tristeza e a ansiedade, que tem como cerne o medo, são epidemias do nosso tempo e muitas vezes se confundem na experiência subjetiva de sofrimento. Assim, respostas afetivas a princípio normais e que nos ajudam a detectar e a aprender sobre os perigos, preparando-nos para eventos futuros, acabam se tornando sentimentos constantes e generalizados. A tristeza da pessoa deprimida pode se mostrar com mudanças no sono, no apetite, no sistema imunológico, dores no corpo, dificuldade de memória, de concentração, irritabilidade, cansaço e também medo. O medo muitas vezes é difuso e motivado por experiências cotidianas, como ficar sozinho em casa, ou estar entre muitas pessoas. O fato de não conseguir justificar suas próprias reações logicamente torna o paciente ainda mais perturbado e isolado. Ele sabe da aparente desproporção entre o que sente e o que de fato acontece e não consegue compartilhar a sua dor.
De um modo geral, sem ajuda profissional, a tendência é de agravamento e não de melhora espontânea. Durante o tratamento, além do uso de medicação (muitas vezes necessária) é fundamental que a pessoa se volte para si mesma, reveja sua trajetória e procure mudanças na sua forma de perceber e de reagir ao mundo. Aqui retomo a pergunta referente à causa do medo e da tristeza do homem dos nossos dias e tenho como resposta pessoal a nossa forma de vida. Concorrência, imprevisibilidade, mudanças contínuas, rapidez, pressão e isolamento formam uma sociedade de fato ameaçadora. O medo deflagra respostas cerebrais e hormonais de defesa, que, em longo prazo, vão exaurindo os recursos fisiológicos e psicológicos do indivíduo e o levam à depressão. Todavia, tudo depende da forma como a realidade é vista e interpretada. Há pouco tempo, recebi uma paciente extremamente disciplinada e bem sucedida profissionalmente, mas que queria se suicidar. Sendo uma jovem ambiciosa, ela se impunha metas e prazos rigorosos, associados à independência financeira e a prestígio e com isso foi se transformando em seu próprio algoz e tornando a vida para si mesma insuportável. Talvez o desejo de morrer tenha sido uma forma de expressar a percepção de que viver assim não fazia sentido, foi o seu outro lado se rebelando contra essa opressão. Sim, nós internalizamos os valores ditados pelo nosso modelo social de concorrência e consumo e adoecemos na busca de vencer os desafios, de se garantir e se assegurar.
Talvez a grande contribuição das neurociências, da psicologia e da psiquiatria não esteja apenas em desenvolver medicamentos e técnicas terapêuticas, mas em explicar cientificamente como o nosso padrão atual de vida nos faz adoecer e assim desencadear mudanças sociais, políticas e econômicas que nos tragam mais harmonia e mais saúde.