Todos nós aprendemos que não se deve julgar as pessoas pela aparência, entretanto diz o ditado que a primeira impressão é a que fica. Ora, a primeira impressão é justamente a aparência. De fato, nosso cérebro é montado para registrar muitas informações ao mesmo tempo, juntá-las todas e construir em nossas mentes um conjunto uniforme. O nosso cérebro trabalha classificando e enquadrando em categorias, de forma que percepções novas são interpretadas e agrupadas nas categorias pré-existentes, ou seja, naquelas construídas a partir de experiências anteriores. Por exemplo, se eu vejo um objeto com encosto e quatro apoios, rapidamente coloco-o na categoria cadeira, seja ele feito de madeira, ou metal, seja ele rebuscado, ou simplista. Nesse processo, o nosso conhecimento sobre o mundo, sobre o que é bom e o que é ruim, sobre regras de conduta, etc. vai sendo pouco a pouco ampliado e sedimentado, o que nos torna mais seguros nas nossas interações e escolhas. Todavia, justamente aqui está a fonte do preconceito e do estigma, ou seja, a tendência de classificar em categorias já conhecidas cria no nosso cérebro a dificuldade de lidar com impressões inéditas, ou por demais complexas, ou seja, aquelas que não se deixam enquadrar nos conceitos já estabelecidos sobre o certo e o errado, o feio e o bonito, etc.
Nossa mente é simplificadora e é por isso que o novo exige esforço, pois sua interpretação implica em reestruturação do nosso conhecimento. Por exemplo, uma idosa tatuada, um médico negro, uma mulher homossexual de trejeitos femininos, ou uma modelo obesa são impressões que se desviam das classificações padrão e nos instigam a desconstruir convicções já construídas. Na maioria das vezes, nossa tendência é a rejeição, que é o caminho mais fácil e seguro. Em sociedades mais tradicionais, as inovações são severamente punidas; em outras, como na nossa, elas são formas de contestação e diversificação. Continuamente surgem novas tribos, com discursos próprios que, muitas vezes são aos poucos agregados e se tornam também tradições para as novas gerações.
Por tudo o que foi dito acima, fica claro que a aparência tem um efeito psicológico enorme, podendo mudar grandemente a forma como a pessoa se vê e avalia seu próprio potencial e a forma como é recebida em seu meio. Esse é um aspecto ainda pouco estudado pelos profissionais de saúde, mas que precisa ser envolvido nos cuidados e apoio às pessoas em situação de doença, ou de problemas sociais. A ajuda na construção da imagem pode mudar o destino de pessoas com déficit intelectual, esquizofrenia, doenças de pele, depressão, dependência química, demência, dentre outros muitos exemplos de situações altamente estigmatizadas. Assim, essa forma de ajuda faz parte de uma abordagem mais completa de saúde mental, inclusão social e cidadania.
A aparência pode fortalecer a pessoa, permitindo uma forma de expressão da sua individualidade, ao mesmo tempo em que agrega e concretiza sua aceitação e participação no grupo. Ela pode abrir o caminho para a saída do isolamento e da exclusão. Como no conto de fadas, é pelo caminho da aparência que se deixou de ser o patinho feio para se tornar o cisne real.